Dalek: o vilão cibernético de Dr. Who vira o terror dos segredos sobre UAPs/OVNIs

Dalek: o vilão cibernético de Dr. Who vira o terror dos segredos sobre UAPs/OVNIs
Sistema autônomo de câmeras Dalek, para monitoramento UAP, do Projeto Galileo (Divulgção Projeto Galileo - https://doi.org/10.3390/s25030783)

O sistema Dalek, uma matriz de câmeras infravermelhas de céu completo, está prestes a se tornar um dos principais instrumentos dos observatórios terrestres multimodais e multiespectrais do Projeto Galileo, com a missão de monitorar continuamente o céu e coletar dados científicos abertos para o estudo de Fenômenos Anômalos Não Identificados (UAPs). Este esforço pioneiro, que concluiu seu período de comissionamento de cinco meses entre janeiro e maio de 2024, já reconstruiu aproximadamente 500.000 trajetórias de diversos objetos aéreos, estabelecendo uma linha de base inicial para o desempenho do sistema.

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A iniciativa foi concebida para preencher uma lacuna crítica: a escassez de dados científicos publicamente disponíveis sobre UAPs cujas propriedades e cinemática alegadamente excedem o envelope de desempenho de fenômenos conhecidos.

Localizado em seu protótipo inicial na Universidade de Harvard, em Massachusetts, o sistema Dalek opera com o auxílio de sofisticados modelos de aprendizado de máquina, como o You Only Look Once (YOLO) para detecção de objetos e o Simple Online and Realtime Tracking (SORT) para reconstrução de trajetórias. Esses algoritmos são meticulosamente treinados com base em objetos aéreos convencionais – incluindo aviões, drones, balões, pássaros e satélites – permitindo que o sistema filtre o conhecido e, crucialmente, identifique casos atípicos que merecem investigação aprofundada.

Para aprimorar sua capacidade e mitigar uma limitação inicial de não estimar distâncias, o Projeto Galileo está expandindo sua infraestrutura com a construção de dois novos observatórios Dalek na Pensilvânia e em Nevada, com o objetivo de instalar múltiplas unidades espaçadas por alguns quilômetros para permitir a triangulação 3D de objetos e, consequentemente, a determinação de suas velocidades e acelerações reais.

O sentinela do céu e sua missão pioneira

O nome “Dalek”, embora evocando os antagonistas robóticos da franquia Doctor Who, foi escolhido para sublinhar a natureza rigorosa e implacável da vigilância científica do céu, inspirando-se na ficção para realçar seu caráter científico. Longe de ser uma caça sensacionalista a alienígenas, o projeto Dalek, sob a liderança do Professor Avi Loeb, da Universidade de Harvard, é fundamentado em um equilíbrio delicado entre inovação tecnológica, rigor metodológico e cautela na interpretação dos resultados. O objetivo primário é tornar o desconhecido mensurável.

O Projeto Galileo, inaugurado em julho de 2021 e liderado por Avi Loeb, da Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, tem como objetivo principal coletar dados científicos de alta qualidade sobre fenômenos aéreos não identificados. Esta iniciativa aborda uma deficiência notável na pesquisa de UAPs: a falta de informações científicas e publicamente disponíveis sobre objetos cujas características de voo supostamente transcendem as capacidades conhecidas.

O trabalho do Projeto Galileo está alinhado com as recomendações da NASA, que em um estudo independente de 2023, sublinhou a importância de “múltiplos sensores bem calibrados” e a coleta de “dados multiespectrais” para o estudo de UAPs.

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O primeiro protótipo do observatório Dalek já opera como uma ferramenta central nesse empreendimento. Ele é uma matriz de oito câmeras infravermelhas de onda longa (LWIR) FLIR Boson 640, dispostas em um arranjo hemisférico e central para fornecer uma visão de 360 graus. Além disso, o sistema ganhou uma nona câmera, também apontando para o zênite, a ZWO ASI462MC (multiespectral, operando na faixa da luz visível/próximo-infravermelho). Ela foi “construída no Dalek” mas não estava sendo utilizada no período de comissionamento detalhado no artigo principal principal divulgado sobre o projeto.

Esta configuração permite uma cobertura abrangente do céu, essencial para capturar e rastrear objetos aéreos de forma contínua. O sistema se beneficia da proximidade de um aeroporto regional, o que garante um fluxo constante de aeronaves para calibração e comissionamento.

Uma das filosofias centrais do Projeto Galileo, conforme expressou o Professor Avi Loeb ao Universe Today, é a transparência dos dados.

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“Muitas vezes, os dados do governo dos EUA são classificados, seja porque foram coletados por sensores confidenciais, seja porque não são totalmente compreendidos e podem, potencialmente, ter relevância para a segurança nacional. Na dúvida, os dados não são divulgados ao público ou à comunidade científica. No entanto, o céu não é classificado, e por isso o Projeto Galileo está operando um observatório de céu completo na Universidade de Harvard e construindo outros dois observatórios na Pensilvânia e em Nevada, que estão buscando objetos anômalos nas faixas infravermelha, óptica, de rádio e de áudio”, declarou.

Esta abordagem de dados abertos e acessíveis contrasta com a natureza frequentemente confidencial das informações governamentais sobre UAPs.

Por trás das lentes: tecnologia de IA e calibração inovadora

A robusta estrutura do Dalek é uma das chaves para sua operação contínua em condições climáticas adversas. A cúpula de fibra de vidro, por exemplo, foi projetada para suportar ventos de até 200 mph com deformação radial mínima, garantindo a proteção das sensíveis câmeras infravermelhas. Para manter o ambiente interno seco, o gabinete inclui dois recipientes de dessecante de 72 polegadas cúbicas, que são reutilizáveis após cozimento para liberar a umidade absorvida. Além disso, um ventilador no gabinete ajuda a dissipar o calor excessivo, seja da luz solar direta ou da emissão de calor do hardware, mantendo as câmeras FLIR Boson 640 abaixo da temperatura máxima de operação de 80 °C.

Para proteger os sensores infravermelhos da luz solar direta, que pode danificá-los, o Dalek incorpora protetores (chamados palas) programáveis em cada câmera. Essas proteções, montadas com servo-controles e controladas por um microcontrolador Arduino, abrem e fecham automaticamente de acordo com a posição do sol no céu. Isso significa que, embora todas as câmeras funcionem durante a noite, durante o dia, cada uma tem um cronograma de gravação diferente; as câmeras voltadas para o norte gravam por mais tempo, enquanto as voltadas para o sul gravam por períodos mais curtos. As pala também possuem escovas integradas para remover detritos das janelas periodicamente.

A complexa montagem de câmeras e sensores Dalek, que permite vigilância aérea 24 horas por dia (Divulgação - Projeto Galileo - https://doi.org/10.3390/s25030783)
A complexa montagem de câmeras e sensores Dalek, que permite vigilância aérea 24 horas por dia (Divulgação – Projeto Galileo – https://doi.org/10.3390/s25030783)

Um aspecto inovador do Dalek é seu método de calibração extrínseca, que utiliza dados de aeronaves equipadas com ADS-B (Automatic Dependent Surveillance–Broadcast). Ao contrário das câmeras de luz visível que podem usar estrelas para calibração astrométrica, as câmeras infravermelhas de onda longa do Dalek não conseguem ver estrelas. Assim, o sistema se baseia em aeronaves que emitem em comprimentos de onda LWIR e refletem emissões do solo quente. Os dados ADS-B, que incluem posições de latitude, longitude e altitude quase em tempo real (transmitidas a cada ~2 segundos), são coletados de bases de dados como o OpenSky Network. Usando as coordenadas 3D fornecidas pelo ADS-B e as localizações de pixel da câmera, o algoritmo Perspective-n-Point (PnP) do OpenCV calcula a pose da câmera no mundo, gerando uma matriz de rotação. Este processo é repetido semanalmente, com dados de pelo menos 20 aeronaves, para monitorar e ajustar quaisquer pequenas flutuações na orientação das câmeras.

Além da calibração posicional, o Dalek também passa por uma calibração térmica para suas câmeras FLIR Boson 640, permitindo o uso de dados de 16 bits para radiometria térmica. Embora a Dalek tenha coletado principalmente gravações de 8 bits durante o período de comissionamento, a capacidade de registrar dados de 16 bits é crucial para caracterizar a temperatura dos objetos em conjunto com a estimativa de distância via triangulação. Este estudo incluiu uma demonstração de prova de conceito para estimar a temperatura de um objeto aéreo (um Airbus A321 a 5,3 km de distância) usando as calibrações, mostrando a viabilidade futura dessa funcionalidade. Essa capacidade, juntamente com a detecção e reconstrução de trajetórias baseadas em aprendizado de máquina (YOLOv5 e SORT), posiciona o Dalek como uma ferramenta poderosa para entender as propriedades físicas dos objetos aéreos.

Resultados iniciais e o desafio dos fenômenos anômalos

Durante o período de comissionamento de cinco meses (janeiro a maio de 2024), o sistema Dalek reconstruiu aproximadamente 500.000 trajetórias de vários objetos aéreos, proporcionando uma vasta quantidade de dados para análise. Uma busca preliminar e simplista por anomalias (“toy outlier search“) foi realizada, concentrando-se na sinuosidade aparente das trajetórias 2D reconstruídas. A sinuosidade é definida como o comprimento total da trajetória dividido pelo comprimento da linha reta do ponto inicial ao final da trajetória.

A análise revelou que cerca de 16% dessas trajetórias (aproximadamente 81.873) foram sinalizadas como anômalas, apresentando valores de sinuosidade superiores a 3.0. Após um exame manual dessas trajetórias sinalizadas, 144 delas permaneceram ambíguas. Os pesquisadores observam que esses casos provavelmente ainda se referem a objetos mundanos que não puderam ser classificados com maior precisão devido à falta de informações adicionais, como distância ou outras modalidades de sensores. Esse desafio ressalta a importância da futura capacidade de triangulação.

Para quantificar a significância da busca por anomalias, foi aplicada uma análise estatística baseada em verossimilhança. Esta análise resultou em um limite superior de 18.271 anomalias (com base nos critérios de “toy outlier“) para o período de cinco meses, com um nível de confiança de 95%. Este número corresponde a aproximadamente 4% dos objetos reconstruídos e 22% dos objetos inicialmente marcados como anomalias com base em sua sinuosidade. Em comparação, agências governamentais como o All-domain Anomaly Resolution Office (AARO), que frequentemente têm acesso a dados de radar para estimativa de distância e múltiplos sensores, relataram que cerca de 3% dos casos sob sua atenção permaneceram ambíguos. O Projeto Galileo espera diminuir seu limite superior no futuro com melhorias na detecção e a inclusão de múltiplos instrumentos.

O desempenho da detecção do Dalek para aeronaves equipadas com ADS-B revelou uma taxa de aceitação de 41% (fração de aeronaves que passaram pelo campo de visão efetivo de pelo menos uma câmera e foram gravadas) e uma eficiência média de detecção quadro a quadro de 36% (fração de aeronaves gravadas em quadros individuais que foram detectadas com sucesso). A eficiência da detecção é influenciada por uma série de fatores, incluindo condições climáticas como precipitação, visibilidade atmosférica reduzida, alta umidade relativa, e a presença de poeira ou gotas de chuva na lente, além da interferência do crescimento da linha das árvores.

Os estudos com dados sintéticos também indicaram que cerca de 15% das trajetórias reais foram completamente perdidas (sem detecção ou reconstrução), e 13% das trajetórias reconstruídas eram espúrias, não correspondendo a nenhuma trajetória real. Além disso, a fragmentação das trajetórias reconstruídas dificultou a precisão na estimativa da velocidade aparente, com uma trajetória real sendo, em média, dividida em três fragmentos menores. Todos esses dados mostram que o sistema ainda vai precisar de bastante trabalho de refinamento e treinamento dos sistemas de inteligência artificial.

Visão de futuro: triangulação e expansão global

Os resultados do comissionamento do Dalek, embora promissores, sublinham a necessidade de aprimoramentos significativos, especialmente na capacidade de determinar a distância dos objetos observados. Atualmente, a distância, o tamanho, a velocidade e a aceleração de um objeto são quantidades interligadas e, portanto, degeneradas sem uma estimativa precisa de distância. Para superar essa limitação, o Projeto Galileo tem planos concretos para instalar múltiplas unidades Dalek separadas por alguns quilômetros. Essa configuração permitirá a triangulação de objetos aéreos para determinar sua localização em 3D e, consequentemente, sua velocidade e aceleração reais.

Em um esforço para acelerar a coleta de dados e expandir a área de cobertura, o Projeto Galileo está em processo de estabelecer dois observatórios adicionais além da unidade de Harvard: um na Pensilvânia e outro em Nevada. O objetivo é triplicar a taxa de coleta de dados nos próximos seis meses. Conforme detalhado por Avi Loeb, cada um dos três observatórios planeja detectar cerca de 100.000 objetos por mês, contribuindo para um banco de dados maciço que já alcançou a marca de aproximadamente 1 milhão de objetos próximos à Terra. Loeb enfatizou o objetivo final:

“Nosso objetivo é verificar se existe algum objeto que apresente características de voo ou formatos anômalos. Mesmo que um em um milhão demonstrasse capacidades além das tecnologias humanas conhecidas, isso já constituiria a maior descoberta científica da história. Um objeto assim poderia sugerir a existência de uma civilização tecnológica extraterrestre, da qual poderíamos aprender sobre ciência e tecnologia mais avançadas do que aquelas desenvolvidas pela humanidade no último século”.

O Dalek é um componente central de uma estratégia mais ampla do Projeto Galileo para desenvolver uma estação de estudo multissensorial, capaz de integrar dados de áudio, rádio e espectro visível, além do infravermelho. O projeto prevê a criação de três classes de sistemas de instrumentação: Observatórios (otimizados para precisão, sensibilidade e cobertura, como o Dalek, com custo aproximado de $250.000 cada), Unidades Portáteis (para estudos de campo de curto prazo, cerca de $25.000) e Sistemas de Malha (Mesh Systems) (otimizados para custo e ampla distribuição, cerca de $2.500). Esses sistemas são projetados para operação autônoma e contínua, visando um censo aéreo multimodal de longo prazo, com duração de pelo menos um ano para capturar variações sazonais.

O temivel vilao Dalek do seriado britanico Dr. Who inspiracao para o projeto Geograph project collection por Colin Smith
O temível vilão Dalek, do seriado britânico Dr. Who, inspiração para o projeto (Geograph project collection, por Colin Smith, Licença Creative Commons Attribution-Share Alike 2.0 Generic / Wikimedia)

A equipe também planeja refinar os algoritmos de aprendizado de máquina com dados reais mais diversificados, incluindo objetos menores e sobreposições de objetos sintéticos em imagens de fundo reais. Isso visa melhorar o desempenho geral da detecção e reduzir falsos positivos, como os causados por nuvens. A metodologia de análise baseada em verossimilhança, demonstrada no estudo do Dalek, é generalizável e será aplicada a todas as futuras buscas por anomalias, utilizando diversas métricas (como velocidade aparente, tamanho do objeto ou frequência de luzes intermitentes) e outras modalidades de sensores. Essa abordagem científica e de dados abertos é vista como a chave para uma compreensão mais robusta dos UAPs, como declara o próprio Professor Loeb: “Observe primeiro, interprete depois: esse é o lema do Projeto Galileo“.

Apoio científico e financiamento do projeto

Atualmente, o Projeto Galileo, incluindo o desenvolvimento do sistema Dalek, é financiado exclusivamente por doações privadas. Apesar disso, o projeto desfruta de um notável interesse e apoio indireto de agências governamentais dos EUA e de figuras proeminentes no campo científico, o que valida a importância de sua missão de pesquisa de UAPs. O trabalho do Projeto Galileo se alinha com as recomendações de agências como a NASA, que em seu estudo de 2023, reforçou a necessidade de “múltiplos sensores bem calibrados” e a coleta de “dados multiespectrais” para uma investigação rigorosa dos UAPs.

A importância da iniciativa Dalek e do Projeto Galileo é reconhecida por figuras públicas influentes. Neil deGrasse Tyson, renomado astrofísico, expressou publicamente seu apoio ao financiamento de pesquisas sobre UAPs e especificamente ao Projeto Galileo. Ele destacou a necessidade de investigação científica para questões de defesa e segurança nacional, afirmando: “Ele [Professor Loeb] está associando a ciência analítica real ao empreendimento. Desejo o melhor para o projeto”. Além de Loeb e Tyson, o projeto tem atraído a participação de pesquisadores e especialistas de alto nível, incluindo Eric Weinstein, Jacques Vallée e Garry Nolan, o que confere ao Projeto Galileo uma significativa credibilidade científica e pública.

Apesar do interesse governamental na pesquisa de UAPs, evidenciado pelos relatórios anuais do Office of the Director of National Intelligence (ODNI) e pela criação do All-domain Anomaly Resolution Office (AARO), os dados governamentais frequentemente permanecem classificados. Essa distinção é crucial: enquanto o AARO lida com informações restritas, o Projeto Galileo se dedica à coleta e análise de dados científicos abertos e transparentes, tornando-os acessíveis à comunidade científica e ao público em geral. A abordagem do Dalek é vista como uma forma independente e rigorosa de investigar os UAPs, complementando os esforços governamentais, mas com a vantagem da total transparência.

Assim, o sistema Dalek representa um avanço significativo na investigação científica de UAPs, movendo-se de relatos anedóticos para uma coleta sistemática de dados empíricos. O projeto não busca confirmar teorias preexistentes, mas sim quantificar e caracterizar fenômenos aéreos de forma imparcial, utilizando tecnologia de ponta e metodologia rigorosa. A busca por “tecnoassinaturas” alienígenas, ou seja, evidências de tecnologia não humana, é o objetivo final, que, se alcançado, poderia representar a maior descoberta científica da história, expandindo fundamentalmente a compreensão da humanidade sobre seu lugar no universo.

Redação Vigília

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