Não eram drones: vídeos da USAF mostram aviões comerciais sobre Wright-Patterson

Após a polêmica causada pelos constantes relatos e registros de avistamentos de misteriosos drones nos Estados Unidos — que renderam a eles o apelido popular de “drovnis” (junção de “drone” com “OVNI”) — entre meados de novembro do ano passado e o inicio de janeiro deste ano, muitas perguntas permaneceram sem resposta.
O que, para muitos, se tratou apenas de um efeito manada ou de um frenesi coletivo provocado por más interpretações e equívocos, passou a ser encarado como um fenômeno real, especialmente após autoridades locais, agências policiais, políticos e até a Casa Branca se manifestarem oficialmente sobre o assunto.
Parte dessa preocupação se deve ao fato de que esses sistemas aéreos não tripulados (UAS) passaram a ser vistos, registrados e relatados sobrevoando áreas críticas, como instalações militares, reservas estratégicas de água e infraestrutura sensível. O caso ganhou ainda mais atenção quando a FAA (Administração Federal de Aviação) emitiu restrições temporárias de voo sobre partes de Nova York e Nova Jersey — este último sendo o estado com o maior número de avistamentos e o local onde essas incursões se originaram e ocorreram com mais intensidade.
A partir de meados de novembro de 2024, começaram a ocorrer incursões aéreas por drones sobre importantes bases militares dos Estados Unidos, o que rapidamente acionou a atenção das autoridades federais e locais. Bases como o Picatinny Arsenal e a Naval Weapons Station Earle, ambas em Nova Jersey, relataram oficialmente que estavam tendo seus espaços aéreos violados por objetos voadores não identificados, descritos como drones com comportamento incomum e padrão de voo coordenado.

O caso ganhou notoriedade após o primeiro avistamento confirmado, em 13 de novembro de 2024, sobre o Picatinny Arsenal, uma instalação estratégica do Exército responsável por pesquisa e desenvolvimento de armamentos. Dias depois, a Naval Weapons Station Earle, base da Marinha especializada em logística de munições, também emitiu alertas internos sobre violações do espaço aéreo.
Com a escalada dos avistamentos, o Departamento de Defesa dos EUA (DoD) se pronunciou oficialmente em 14 de dezembro de 2024. Em nota divulgada pelo Estado-Maior Conjunto, o DoD confirmou que havia registrado atividade de drones sobre bases militares em Nova Jersey, mas alegou que esse tipo de incidente “não era algo novo” e que não havia indícios de ameaça estrangeira ou hostilidade. O comunicado, no entanto, evitou responder diretamente sobre a origem dos drones e limitou-se a afirmar que os sistemas de defesa e vigilância estavam ativos e monitorando a situação em parceria com o FBI, FAA e DHS.
Com a falta de uma explicação concreta, perguntas começaram a surgir no Congresso e na mídia. Parlamentares como Michael McCaul, presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, levantaram a hipótese de que os drones poderiam estar ligados à espionagem estrangeira, especialmente da China. O NORAD, por sua vez, revelou que já havia contabilizado mais de 600 incursões não autorizadas sobre bases militares nos dois anos anteriores, reforçando a preocupação com a vulnerabilidade do espaço aéreo norte-americano.
A resposta definitiva — ainda que sucinta e evasiva — viria apenas após a posse do presidente Donald Trump em janeiro de 2025. Conforme prometido em campanha, Trump exigiu um parecer público sobre o caso. Em comunicado oficial da Casa Branca, a secretária de imprensa Karoline Leavitt declarou que os drones avistados “tinham autorização da FAA e não eram inimigos”, acrescentando que a maioria dos objetos era composta por drones comerciais, de pesquisa ou aeronaves tripuladas confundidas com drones por observadores civis.
O governo concluiu afirmando que não havia qualquer ameaça à segurança nacional e que os relatos faziam parte de uma combinação de pânico coletivo, mal-entendidos e operações aéreas legítimas. Ainda assim, a resposta não convenceu a todos, e o episódio permanece envolto em dúvidas sobre a real natureza dos objetos e a transparência das autoridades envolvidas.
USAF libera filmagens de incursões na base Wright-Patterson
Em 11 de julho, a Força Aérea dos Estados Unidos (USAF) divulgou documentos que confirmam que a Base Aérea Wright-Patterson (WPAFB), localizada em Ohio, sofreu múltiplas incursões de drones em meados de dezembro de 2024. Os incidentes resultaram no fechamento temporário do espaço aéreo militar e desencadearam uma resposta de segurança em larga escala por parte das autoridades da base.
A divulgação dos documentos — que incluem sete curtas filmagens registrando as incursões — foi feita por meio do site The Black Vault, após solicitação com base na Lei de Liberdade de Informação (FOIA).
De acordo com os documentos, as incursões envolveram objetos descritos como pequenos quadricópteros pretos, equipados com luzes vermelhas e verdes. Operando em formação de diamante, eles foram avistados sobre diferentes áreas sensíveis da base, como a linha de voo, o quartel dos bombeiros e o museu da Força Aérea.
Apesar do uso de refletores, varreduras no perímetro e do fechamento temporário do espaço aéreo, a origem dos drones não foi identificada. Nos dois episódios registrados — entre 13 e 16 de dezembro de 2024 — os objetos demonstraram voo coordenado, altitude variável e movimentos deliberados, incluindo pairar, descer e recuar rapidamente. As imagens capturadas e os relatos de testemunhas confirmariam o caráter anômalo e organizado das intrusões.
“No drones”: Tudo não passou de erro da USAF
Foi isso que as análises independentes indicaram. No mesmo dia em que os documentos foram divulgados, o cético de OVNIs Mick West analisou os vídeos publicados por John Greenewald, do The Black Vault, em sua conta no X (antigo Twitter). Para surpresa de muitos, West concluiu que tudo não passou de um erro de interpretação: segundo ele, os sete registros divulgados mostravam, na verdade, aeronaves comerciais — não drones.
No primeiro vídeo que analisou, escolhido aleatoriamente, West demonstrou que o objeto registrado era compatível com um pequeno jato sobrevoando a área, voando paralelo à Avenida Skeel.
The first case from Wright Patterson that I looked at (picked at random) corresponded to a small jet flying overhead, parallel to Skeel Ave. I suspect there are many misidentifications. Deconfliction is a significant problem with drone security. https://t.co/6U0IYWFs0h pic.twitter.com/XF9mzfpMci
— Mick West (@MickWest) July 11, 2025
Consequentemente, após analisar os vídeos originais com metadados, Mick West conseguiu sincronizar as informações disponíveis usando o Sitrec, um simulador interativo de reconstrução de trajetória desenvolvido por ele mesmo. (https://github.com/MickWest/sitrec)
A ferramenta permite recriar com precisão o ambiente em que um vídeo foi gravado, utilizando:
Metadados do vídeo (como posição, direção da câmera, horário, altitude etc.);
Modelos 3D de objetos, como aviões, drones e balões;
Trajetórias conhecidas de voos comerciais (quando disponíveis);
Parâmetros físicos da câmera (campo de visão, zoom, movimento).
Com isso, West demonstrou que um outro objeto filmado, (o vídeo 9511) correspondia a uma aeronave comercial, descartando a hipótese de drones desconhecidos.
Thanks to @blackvaultcom for releasing the original videos with metadata. I was able to sync Sitrec to video 9511, which matches the exact time of the written report. This proves conclusively that what was seen (in this one case) was just a normal plane. https://t.co/tfE2lR7vM1 pic.twitter.com/ORjmCm5YYa
— Mick West (@MickWest) July 11, 2025
A partir daí, todos os outros vídeos também foram analisados por Mick West e, segundo ele, todos correspondiam a aeronaves tradicionais, seguindo rotas de voo previamente estabelecidas e definidas.
Em uma postagem feita no mesmo dia 11, West escreveu:
“Analisei todos os sete vídeos divulgados pelo Exército dos EUA mostrando ‘drones’ sobrevoando a Base Aérea Wright-Patterson. Todos os sete são aviões. Seis deles têm identificação exata. Um apenas possui muitas opções plausíveis. As pessoas cometem erros. Mas onde estão os casos com drones de verdade?”
“Eles correspondem em tempo, local, tamanho, velocidade e direção. É muito mais do que apenas ‘parecem’ aviões. É uma correspondência exata. Sete vezes.”
I’ve analyzed all seven videos the US Military released showing “drones” over Wright Patterson AFB.
All 7 are planes. 6 planes have an exact ID. 1 just has too many to choose from.
People make mistakes. But where are the cases with actual drones?https://t.co/EWrDUxkmPp pic.twitter.com/CQJkCYXVp0
— Mick West (@MickWest) July 11, 2025
Em seu fórum, o Metabunk, West dedicou um tópico inteiro para apresentar suas análises e as evidências que sustentam suas conclusões.
https://www.metabunk.org/threads/wright-patterson-drone-documents-and-video-lots-of-planes.14327/
John Greenewald Jr. respondeu às análises de West em uma postagem no Sub UFOs — o maior subreddit de ufologia do Reddit. Na publicação, além de diversas ponderações, ele agradeceu e acolheu com satisfação o trabalho de West, afirmando que não desconsiderava suas conclusões.
My response to the Metabunk debunk of the wPAFB "drone" videos
byu/blackvault inUFOs
Oficialmente, a Força Aérea dos Estados Unidos não se pronunciou sobre o caso. Isso levanta questionamentos quanto à qualificação dos profissionais envolvidos e ao nível de rigor aplicado pela inteligência da USAF. Quando se trata de um tema tão sensível — que envolve diretamente a segurança nacional —, é fundamental que haja atenção minuciosa e total comprometimento com a veracidade dos dados investigados. Situações como esta, envolvendo filmagens de supostos UAS não autorizados sobre áreas militares restritas, devem ser tratadas com a devida seriedade e responsabilidade institucional.
A ausência de esclarecimentos oficiais verídicos pode alimentar desinformação, fomentar teorias infundadas e gerar uma percepção pública de negligência.
Além disso, o episódio reforça a importância do envolvimento da comunidade civil — especialmente pesquisadores independentes, analistas e especialistas em dados — na verificação e análise dessas ocorrências. Ferramentas como o Sitrec, desenvolvidas fora dos círculos governamentais, têm se mostrado eficazes na reinterpretação técnica de casos mal compreendidos, muitas vezes com mais precisão do que os próprios canais oficiais. Isso levanta uma reflexão urgente: estamos diante de uma falha sistêmica na forma como as Forças Armadas dos EUA — ou talvez diversas outras instituições americanas — lidam com essas ocorrências, ou de uma resistência deliberada à transparência?