Nave espacial descobre água em Marte

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As imagens de alta resolução feitas pela Mars Global Surveyor revelaram novas pistas que os cientistas acreditam ser recentes fluxos de água na superfície marciana, uma descoberta que pode causar conseqüências no nosso entendimento do planeta e o potencial para a vida.

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Sinais de água em estado líquido. (NASA/JPL/MSSS)
A notícia, publicada pelo jornal Science mostra cerca de 120 áreas na superfície de Marte recentemente marcadas pela ação da água.

“Essa descoberta é uma grande surpresa e também interessante, porque isso não se encaixa nos padrões que temos de Marte”, disse Michael Malin, do Malin Space Science Systems, um dos responsáveis pelo jornal Science, na conferência de imprensa na NASA.

Nichos e canais

A evidência está na forma de imagens de canais e barrancos nos lados de várias crateras, todas a 30º de latitude sul ou 30º ao norte, com a sua grande maioria no hemisfério sul.

As imagens consistem em três partes: um nicho de materiais nos lados superiores das paredes da cratera, canais que cortam-nas de um lado ao outro, e material depositado pelos canais na parte inferior. Essas características são muito parecidas com as vistas na Terra formadas pela água.

Elas são particularmente intrigantes para os astrônomos, pois existem longe do equador do planeta, onde se achava que poderia haver mais possibilidade de sinais de água. Além disso, elas aparecem nos lados das crateras e depressões que estão longe do equador, e distantes da luz do sol.

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O modelo apresentado por Malin e seu co-autor Ken Edgett para explicar essas características, mostra primeiramente marcas d’água fluindo por uma capa de rocha centenas de metros abaixo da superfície. A água é filtrada pela rocha até encontrar a face da cratera, onde são criadas barreiras de gelo. A pressão da água atrás da barreira de gelo cresce até esta ser destruída, causando uma repentina corrente d’água para fora da cratera, criando assim as imagens feitas pela espaçonave.

O que torna a descoberta particularmente interessante é a idade das formas fotografadas. Enquanto as imagens anteriores de Marte mostravam depressões causadas por correntes d’água, mas com bilhões de anos, as novas parecem ser bem recentes, possivelmente criadas nos dois últimos anos. Eles chegaram a essa conclusão depois de verificarem que não há marcas de impactos de meteoros próximos ao local.

Edgett apontou para uma imagem onde era possível observar linhas claras e escuras, evidência de que as marcas não estão cobertas pela poeira que cobre Marte.

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“Isso vem ocorrendo há um ou dois anos”, disse Edgett.

Especulações sobre as tais correntes de água tiveram início há mais de três anos, baseadas na imagens feitas pela Mars Global Surveyor; mas a baixa qualidade das imagens não forneceu maiores informações na época. “Nós tínhamos um palpite antes, mas agora temos certeza”.

Desafiando padrões e gerando vida

As descobertas, se verdadeiras, vão redefinir as antigas conclusões sobre o planeta. Bruce Jakosky, da Universidade do Colorado, notou que nas latitudes onde as marcas foram encontradas, o solo deveria estar congelado, com uma espessura entre 3 e 7 quilômetros, impedindo assim a formação de correntes de água.

Uma explicação alternativa dada por Mike Carr, da Survey Geological U.S., é que as marcas podem ter sido formadas por correntes de gás e não água. O gás seria parecido com dióxido de carbono, originário da junção de moléculas de dióxido de carbono e partículas de gelo, sobre a superfície.

Se essas marcas foram formadas pela água, os nossos pensamentos sobre a vida no planeta no passado e presente irá mudar. “Se Marte tem todos os requisitos para o desenvolvimento de vida, ainda não sabemos”, disse Jakosky, referindo-se à água em estado líquido, materiais orgânicos e energia presentes no planeta.

A descoberta não significa, no entanto, que foi detectada vida ou que ela possa existir em Marte, e Jakosky disse que seria muito difícil procurar vida lá agora. “Nós sabemos como procurar vida extraterrestre”, disse, “mas não sabemos necessariamente como procurar marcianos”.

Planos futuros

A NASA está planejando confirmar essas imagens na sua próxima missão ao planeta vermelho, com a Mars Surveyor 2001 Orbiter. Essa espaçonave terá um sistema infra-vermelho de alta resolução para buscar locais com evidências de água juntamente com minerais.

Entretanto, os cientistas avisam que talvez o único jeito de ter certeza de que a água formou as marcas será visitando o planeta pessoalmente, pisar no local e recolher amostras.

Tal missão não vai acontecer logo, e essa descoberta também não vai pressionar para a organização de uma missão tripulada antes de um prazo estabelecido.

“Antes de mandarmos um ser humano para Marte, temos muito trabalho por fazer”, afirmou Ed Weiler, administrador associado da NASA para a Ciência Espacial. “Marte está se tornando cada vez mais interessante para nós”.

Água em Marte: separando os fatos do exagero

A descoberta pode gerar uma importante reviravolta no estudo e eventual colonização do planeta vermelho.

A primeira pista sobre as evidências foi dada ao público pelo site da NASA que publicou uma chamada entitulada como a “Grande Descoberta”. O artigo dizia que a agência espacial americana já havia informado a Casa Branca sobre a descoberta e que planejava divulgar a notícia numa coletiva para a imprensa no dia 29 de Junho.

O anúncio deixou os jornalistas apreensivos. Na noite anterior, todos os veículos de informação já especulavam sobre o que seria divulgado, mas sem entrar em detalhes. As listas de discussão on-line também entraram nesse jogo de adivinhação.

Os relatos e rumores logo se concentraram na possível descoberta de água em Marte. Já era sabido que o planeta tinha vastos depósitos de gelo nos seus pólos e que sua atmosfera tinha vapor d’água; em estado líquido nada havia sido encontrado.

As especulações forçaram a NASA, no dia 28 de junho, a antecipar em uma semana o anúncio antes marcado para o dia 30 do mesmo mês na edição do jornal Science.

“Os cientistas que fizeram a descoberta não encontraram nenhum lago ou rio, não encontraram poças d’água e nem banheiras”, disse Ed Weiler, na abertura da coletiva para a imprensa.

Embora a descoberta tenha decepcionado algumas pessoas, a presença de água em estado líquido gera profundas implicações sobre a possibilidade de vida hoje ou no passado.

“Se lá desenvolveu-se vida, então os locais avistados seriam um bom começo”.

A água é o ingrediente final, juntamente com a energia e compostos orgânicos, para o surgimento de vida.

“A questão da vida – no passado, presente ou futuro – domina o interesse do público sobre Marte”, disse Louis Friedman, diretor executivo da Sociedade Planetária. “A possibilidade de vida no planeta é agora mais forte, e as conseqüências para a exploração robótica e humana são excitantes”.

Além do mais, a presença de água na superfície pode tornar as missões tripuladas mais simples e mais baratas, já que os astronautas não teriam que carregar água de Terra para um período de 3 anos.

As dificuldades em procurar água em Marte

As imagens geradas pela MGS já sugeriam que havia água em estado líquido no planeta vermelho, mas não se podia comprovar oficialmente.

A localização das marcas – em altas e frias latitudes – fizeram alguns cientistas ficarem céticos, e as evidências serão ou não confirmadas somente numa próxima missão.

A primeira missão espacial para Marte dos países europeus, a Mars Express, poderá detectar diretamente água numa profundidade entre 3 e 7km, será lançada em 2003. Ela carregará também um radar chamado MARSIS, capaz de mapear locais onde exista água em estado líquido.

“Nós estamos pensando num meio mais eficiente de operar nosso instrumento para conseguir o maior número de informações possível”.

A Mars Express também levará o robô Beagle 2, que também procurará por vestígios.

A NASA ainda não decidiu qual tipo de espaçonave vai enviar, se for mesmo, em 2003. Existem duas possibilidades: uma missão que orbitará e procurará por água no solo do planeta, ou outra que pousará.

“Nós estamos estudando a melhor opção”, disse Ed Weiler.

Meteoro traz novas evidências dos oceanos marcianos

Um dia depois da exibição das imagens mostrando sinais de água em Marte, outro grupo de pesquisadores apresentava uma nova evidência de que os oceanos de Marte, assim como os da Terra, eram salgados.

Cientistas, liderados por Carleton Moore, da Universidade do Estado do Arizona, disseram ter encontrado evidências num meteoro marciano que mostram que os oceanos eram salgados. Essas descobertas serão publicadas na edição de junho do jornal Meteoritcs and Planetary Science.

Os cientistas testaram uma amostra do Nahkla, um meteorito que caiu no Egito em 1911 depois do choque com o planeta Marte. Eles encontraram altas concentrações de cloro, muito dele solúvel em água, além de sódio, magnésio e cálcio.

“Os elementos mais abundantes encontrados foram o cloro e o sódio, como nos oceanos terrestres”, disse Moore. Ele e seus colegas acreditam que a água salgada molhou a rocha e evaporou, depositando sódio, cloro e outros elementos. Depois a rocha foi expelida em direção da Terra devido ao impacto de um cometa.

Parece que num passado longínquo, Marte era bem parecido com o nosso planeta, tendo inclusive oceanos salgados. A descoberta pode também mostrar como a Terra era no seu início.

*Jeff Foust é editor do boletim eletrônico de distribuição gratuita SpaceViews (http://www.spaceviews.com), um dos mais populares na divulgação das ciências espaciais. Ele autorizou a reprodução desta matéria especial. O autor pode ser contatado pelo e-mail jeff@spaceviews.com.
Tradução: Thiago Ticchetti

Redação Vigília

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