3I/ATLAS mostra cauda crescente em novas imagens, mas polêmica sobre “censura” persiste

3I/ATLAS mostra cauda crescente em novas imagens, mas polêmica sobre “censura” persiste
3I/ATLAS (com cauda) registrado pelo Gemini Multi Object Spectrograph (GMOS), no observatório Gemini Sul, em Cerro Pachón - Chile International Gemini Observatory/NOIRLab/NSF/AURA/Shadow the Scientist Image Processing: J. Miller & M. Rodriguez (International Gemini Observatory/NSF NOIRLab), T.A. Rector (University of Alaska Anchorage/NSF NOIRLab), M. Zamani (NSF NOIRLab)

O misterioso objeto interestelar 3I/ATLAS, um visitante de outro sistema estelar que tem intrigado cientistas e entusiastas do espaço, revelou uma espetacular cauda crescente em novas imagens capturadas pelo Observatório Gemini Sul. As observações foram realizadas como parte de uma colaboração internacional que visa desvendar os segredos deste corpo celeste incomum, fornecendo dados cruciais sobre sua composição e evolução.

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Embora as versões processadas tenham sido divulgadas apenas em 4 de setembro, as imagens foram obtidas em 27 de agosto de 2025 através do Espectrógrafo Multiobjeto Gemini (GMOS) no telescópio localizado em Cerro Pachón, Chile. O observatório gravou todo o processo do experimento, inclusive, e o publicou no dia seguinte, 28 de agosto, no Youtube. Os registros exibem uma cabeleira ampla de gás e poeira, além de uma cauda estendendo-se por cerca de 1/120 de grau no céu, apontando para longe do Sol. Essas características são significativamente mais pronunciadas do que em registros anteriores, indicando que o 3I/ATLAS se tornou mais ativo à medida que se aprofunda em sua jornada pelo sistema solar interno.

Apesar dessas revelações científicas, a narrativa em torno do 3I/ATLAS continua influenciada pela divulgação sensacionalista. Desde sua descoberta, acusações de que a NASA estaria “censurando” informações e imagens do objeto ganharam força. Essa semana, a discussão sobre a suposta falta de transparência da agência espacial foi reacendida após a divulgação pelo site The Black Vault de documentos relacionados a um caso não diretamente ligado ao 3I/ATLAS, mas que levantou novamente questões sobre a ocultação de informações da NASA.

As observações no Observatório Gemini Sul não só produziram visuais impressionantes, mas também permitiram a obtenção do espectro do cometa, uma análise detalhada dos comprimentos de onda de luz que ele emite. Essa análise é fundamental para decifrar sua composição e química, oferecendo pistas sobre como o objeto se transforma ao passar por nossa vizinhança cósmica.

Karen Meech, astrônoma do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí e líder do programa científico, expressou o entusiasmo da equipe:

Os objetivos principais eram observar as cores do cometa, que fornecem pistas sobre a composição e o tamanho das partículas de poeira, e obter espectros para uma medição direta de sua composição química. Ficamos animados ao ver a cauda crescendo e tivemos o primeiro vislumbre de sua composição química a partir dos espectros“.

As novas observações sugerem que a poeira e o gelo encontrados no 3I/ATLAS são notavelmente semelhantes aos de cometas originários do nosso próprio sistema solar. Esta semelhança aponta para processos de formação planetária compartilhados em sistemas estelares distantes, contrariando um estudo anterior que indicava que o objeto era “bem diferente da maioria dos cometas conhecidos”. Complementarmente, a missão SPHEREx da NASA, que capta luz infravermelha, detectou entre 8 e 12 de agosto uma “cabeleira” de dióxido de carbono de quase 350 mil km de extensão, além de gelo de água no núcleo do 3I/ATLAS. Carey Lisse, astrônomo da Universidade Johns Hopkins e membro da equipe científica do SPHEREx, afirmou que “A descoberta de grandes quantidades de gás dióxido de carbono vaporizado pelo SPHEREx ao redor do 3I/ATLAS nos mostra que ele poderia ser como um cometa normal do Sistema Solar“.

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Imagem do 3I/ATLAS registrada pelo Gemini Multi Object Spectrograph (GMOS), no observatório Gemini Sul, em Cerro Pachón - ChileInternational Gemini Observatory/NOIRLab/NSF/AURA/Shadow the Scientist Image Processing: J. Miller & M. Rodriguez (International Gemini Observatory/NSF NOIRLab), T.A. Rector (University of Alaska Anchorage/NSF NOIRLab), M. Zamani (NSF NOIRLab)
Imagem do 3I/ATLAS registrada pelo Gemini Multi Object Spectrograph (GMOS), no observatório Gemini Sul, em Cerro Pachón – Chile
International Gemini Observatory/NOIRLab/NSF/AURA/Shadow the Scientist
Image Processing: J. Miller & M. Rodriguez (International Gemini Observatory/NSF NOIRLab), T.A. Rector (University of Alaska Anchorage/NSF NOIRLab), M. Zamani (NSF NOIRLab)

Os dados revelaram uma coma rica em dióxido de carbono, com quase nenhuma presença de monóxido de carbono, e um núcleo de água congelada. Essa composição sugere que o cometa pode ter passado por um intenso aquecimento em seu sistema original antes de ser ejetado para o espaço interestelar, indicando uma história de vida mais longa e intensa do que os cometas tipicamente encontrados em nosso sistema. Os cientistas especulam que o 3I/ATLAS pode ter se originado do disco espesso da Via Láctea, a região mais antiga da galáxia, e ter uma idade duas vezes maior que a do nosso Sistema Solar.

Bryce Bolin, cientista da Eureka Scientific, enfatizou a importância dessas descobertas: “Essas observações fornecem uma visão impressionante e dados científicos cruciais. Cada cometa interestelar é um mensageiro de outro sistema estelar e, ao estudar sua luz e cor, podemos começar a compreender a diversidade de mundos além do nosso“. O 3I/ATLAS, descoberto em 1º de julho de 2025, é apenas o terceiro objeto interestelar confirmado, seguindo 1I/Oumuamua e 2I/Borisov, e sua órbita hiperbólica significa que ele retornará ao espaço interestelar após sua breve passagem, tornando cada observação uma oportunidade inestimável.

Níquel puro: evidência de uma nave espacial?

Entre outras estranhezas do longínquo objeto 3I/ATLAS que têm gerado especulações sensacionalistas, as observações mais recentes detectaram a presença de níquel puro (Ni) sendo ejetado. Dentro do sistema solar, é comum encontrar a combinação Niquel-Ferro, na forma de partículas em volta dos objetos. Para muitos divulgadores adeptos do catastrofismo e especulação, a presença de níquel sem ferro é uma evidência de que o 3I/ATLAS seria um artefato produzido artificialmente, talvez até mesmo uma nave espacial.

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O que as teorias da conspiração não informam é que, embora nunca tenha sido detectada em objetos já presentes no nosso Sistema Solar, a detecção de níquel puro poderia ser decorrente de outro composto, cuja presença já havia sido teorizada no passado para a formação de cometas. A teoria científica sugere a presença de moléculas de tetracarbonil de níquel (Ni(CO)4) na coma (cauda) do cometa. Essa molécula é extremamente volátil e se decompõe facilmente sob a luz ultravioleta do Sol, liberando átomos de níquel e monóxido de carbono (4CO). Este processo não necessita da presença de ferro, justificando a observação anômala.

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Será que o 3I/Atlas guarda alguma surpresa? Ilustração gerada com IA

Entretanto, é um fato: esse ainda é um mistério do viajante a ser esclarecido. O tetracarbonil de níquel não é comum em cometas da nossa vizinhança local; na verdade, a sua potencial detecção é uma descoberta muito recente e surpreendente. Até as observações do objeto 3I/ATLAS, a presença de Ni(CO)4 em cometas era apenas teórica e nunca havia sido confirmada. A composição típica de um bólido desses inclui gelo de água, monóxido de carbono, dióxido de carbono, metano, amônia, poeira e rochas. Além disso, a baixa detecção de monóxido de carbono — pelo menos nos registros até agora — poderiam tornar essa explicação ainda mais difícil de explicar.

NASA censurou imagens do 3I/ATLAS feitas pelo James Webb?

A suposta “censura” de dados do 3I/ATLAS pela NASA, especialmente os do telescópio espacial James Webb (JWST), tem sido outro ponto de discórdia e gerado especulações. No entanto, o que muitos interpretam como censura é, na verdade, um protocolo padrão no mundo da pesquisa científica conhecido como embargo. Este procedimento visa proteger os cientistas que propõem e realizam observações com equipamentos de alta demanda, como o James Webb.

O processo funciona da seguinte forma: um cientista que consegue a permissão para usar o James Webb, após ter sua proposta validada e passar por uma longa fila de espera, obtém os dados de suas observações. Para garantir que esse cientista tenha tempo de analisar os dados e publicar seu artigo antes que outros possam acessá-los e publicar estudos semelhantes, é imposto um período de embargo. Esse período geralmente dura de seis meses a um ano, mas, no caso do 3I/ATLAS, devido à sua natureza passageira, foi reduzido para três meses. Após a publicação do artigo pelo cientista principal, os dados são então liberados publicamente para que outros pesquisadores possam fazer revisões por pares e análises adicionais.

Alguns divulgadores científicos têm tentado explicar esse protocolo, ressaltando que essa “demora” na liberação dos dados é uma prática comum e não uma ocultação intencional. Contudo, canais sensacionalistas e teóricos da conspiração frequentemente exploram a falta de compreensão sobre o processo científico, interpretando o embargo como censura. As características incomuns do 3I/ATLAS – que não se assemelha totalmente a um cometa nem a um asteroide, e as especulações de figuras como Avi Loeb sobre sua possível natureza de artefato alienígena – alimentam ainda mais essas teorias.

A discussão sobre a transparência da NASA ganhou um novo impulso esta semana com uma publicação do site The Black Vault, que detalhou a experiência de solicitar registros de briefings do Congresso sobre o James Webb. Embora o pedido do The BlackVault não estivesse diretamente relacionado às observações do 3I/ATLAS, mas sim a especulações mais amplas sobre descobertas surpreendentes do telescópio e possíveis briefings secretos com legisladores, a resposta da NASA reacendeu o debate. Inicialmente, a agência negou a existência de quaisquer registros, mas, após um recurso, admitiu ter localizado documentos preparatórios para uma audiência pública de 2022 sobre os resultados do JWST. No entanto, quase todo o conteúdo desses documentos foi redigido, com a NASA invocando a exceção (b)(5) do FOIA, que protege comunicações internas pré-decisórias.

Novamente a história (inventada) da presença de um objeto massivo

A decisão da NASA de ocultar essas informações, mesmo em um contexto não classificado e relacionado a uma audiência pública, levantou questionamentos sobre a transparência da agência. Ela acirrou uma desconfiança sempre presente na comunidade ufológica de que a agência governamental, embora seja um organismo civil e não parte dos aparatos da Defesa, esconde informações sobre alienígenas. No entanto, também há potenciais razões convencionais para essa “censura” em materiais não diretamente relacionados ao 3I/ATLAS. E elas estão relacionadas a protocolos internos da NASA, principalmente levando em consideração a invocação da expressão “comunicações pré-decisórias“:

Primeiramente, trata-se da proteção de debates internos. Os documentos liberados eram rascunhos e materiais preparatórios, não artigos científicos revisados por pares nem dados brutos. A agência adota a mesma conduta geralmente empregada no meio acadêmico, que busca evitar que ideias preliminares ou especulativas, que não representam a posição oficial da instituição, sejam interpretadas como fatos concretos. A experiência com figuras como Avi Loeb, cujas especulações sobre o 3I/ATLAS foram frequentemente tiradas de contexto e apresentadas como fatos, ilustra o risco de “ruído” e desinformação.

Em segundo lugar, a NASA visa evitar a descontextualização de informações. Notas internas, mensagens-chave ou previsões de perguntas para os congressistas, se divulgadas isoladamente, poderiam reforçar boatos infundados, como a suposta detecção de um objeto misterioso vindo em direção à Terra – a própria especulação que motivou o pedido do The Black Vault.

Telescópio James Webb detecta objeto vindo para a Terra ou anatomia de uma conspiração (arte-montagem com auxílio de IA)
Telescópio James Webb detecta objeto vindo para a Terra ou anatomia de uma conspiração (arte-montagem com auxílio de IA)

Em reportagem à época desse boato, o Portal Vigília mostrou detalhadamente como essa história do suposto objeto, carente de qualquer lastro real, surgiu de comentários de Youtubers sem qualificação científica que acabaram sendo amplificados e distorcidos depois de reverberarem em múltiplos canais. Os próprios autores nunca mais voltaram a tratar do tema e as promessas de então — de que os cientistas responsáveis por um tal vazamento fariam suas revelações em poucas semanas ou meses — nunca foram cumpridas.

Por fim, há a manutenção do rigor científico e a proteção de futuras discussões. Agências espaciais geralmente só liberam descobertas após passarem por um rigoroso processo de revisão por pares e publicação científica. A liberação de materiais preparatórios sem o mesmo rigor poderia abrir um precedente, pressionando a agência a liberar todas as reuniões internas futuras, o que tornaria cientistas e gestores menos à vontade para discutir e especular abertamente sem o risco de terem suas palavras tiradas do contexto e distorcidas publicamente. Portanto, o caso do The Black Vault, embora distinto do embargo do 3I/ATLAS, contribui para um clima de desconfiança que afeta a percepção pública da comunicação científica da NASA.

Jeferson Martinho

Jornalista, o autor é empresário de comunicação, dono de agência de marketing digital e assessoria de imprensa, publisher de um portal de notícias regionais na Grande São Paulo, fundador e editor do Portal Vigília. Apaixonado por Ufologia de um ponto de vista científico, é autor do livro "Nem Todo OVNI é Extraterrestre - Um guia para entusiastas da ufologia que não querem ser iludidos", disponível na Amazon.

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