A foto de disco de Elizondo, o peso da responsabilidade e a agenda do ex-oficial

A foto de disco de Elizondo, o peso da responsabilidade e a agenda do ex-oficial
Elizondo exibe a imagem de um campo de irrigação como 'disco voador' em audiência UAP (Reprodução/Youtube)

A mais recente polêmica envolvendo Luis Elizondo — ex-diretor do programa secreto AATIP (Advanced Aerospace Threat Identification Program) — reacende dúvidas incômodas sobre a condução e a real intenção de sua jornada pública à frente do debate sobre UAPs (sigla para fenômenos anômalos não identificados). O episódio em questão gira em torno da apresentação de uma imagem de suposto disco voador, exibida por Elizondo durante um fórum recente que reuniu nomes importantes da ufologia internacional, além de políticos e estudiosos do fenômeno.

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O evento “Compreendendo os UAPs: Ciência, Segurança Nacional e Inovação”, sob a supervisão e responsabilidade da Câmara dos Representantes dos EUA, tinha como um de seus principais objetivos dar voz às testemunhas e especialistas que têm desempenhado papel central na nova fase do debate sobre os UAPs. Participaram da audiência personalidades como Avi Loeb, astrofísico de Harvard, além de nomes como Eric Davis e Tim (Timothy Cole) Gallaudet.

Foi nesse ambiente, de grande exposição midiática e sensibilidade política, que Elizondo apresentou a imagem — uma suposta fotografia de um objeto em forma de disco tirada por um piloto civil. A recepção foi instantaneamente dividida: contaminou o debate mundial através de manchetes sensacionalistas mas, rapidamente, especialmente entre membros da comunidade cética e parte da própria ufologia, virou sinônimos de amadorismo e a irresponsabilidade da ação.

Poucas horas após as primeiras manchetes, vários internautas e perfis na Internet já divulgavam que a foto, na verdade, retratava apenas um campo de irrigação, facilmente comprovável através de imagens mais atuais do local do registro. O fórum cético Metabunk fez um excelente trabalho apurando a história e documentando a descoberta.

No forum Metabunk, rapidamente os usuários encontraram o local exato e seu aspecto (não muito diferente) atual uando o Google Maps e ajustes de cor na imagem (Reprodução/Metabunk)
No forum Metabunk, rapidamente os usuários encontraram o local exato e seu aspecto (não muito diferente) atual usando o Google Maps e ajustes de cor na imagem (Reprodução/Metabunk)

A pressão e as críticas levaram Elizondo a emitir uma nota pública — através da rede social X (ex-Twitter) — para esclarecer a origem e o propósito da imagem. Em suas palavras:

“A foto específica havia sido fornecida a mim apenas naquela manhã, antes do fórum. A foto NÃO TINHA SIDO verificada ainda […] Eu só recebi permissão para liberá-la naquela manhã e só fui informado sobre isso pouco antes.”

E complementou:

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“O propósito de eu mostrar a foto era ilustrar a necessidade de pilotos civis e comerciais terem um mecanismo central de relatórios para relatar avistamentos anômalos.”

Apesar da tentativa de esclarecimento, há um problema de fundo que Elizondo parece, ou não compreender, ou escolher ignorar: ele não é mais apenas um “porta-voz de ideias”. É, hoje, uma das principais figuras responsáveis pela reestruturação do debate público sobre OVNIs nos Estados Unidos. Desde que decidiu sair das sombras e tornar pública a existência do AATIP, Elizondo pavimentou o caminho para um novo paradigma — que culminou em audiências no Congresso, mudanças institucionais dentro do Pentágono e a criação de novos mecanismos de monitoramento e análise de UAPs.

Não é possível — ou aceitável — que um personagem com tal peso político e simbólico ignore o impacto de suas ações. Elizondo pode até ter dito, literalmente, que a imagem “não foi verificada”, mas a simples decisão de apresentá-la, num fórum de tamanha importância, sem qualquer análise prévia ou contexto técnico, levanta questões graves sobre sua responsabilidade e discernimento. Como ele mesmo escreveu:

“Eu poderia ter usado uma foto de uma câmara de ar para provar meu ponto, mas usei em vez disso uma foto real, tirada por um piloto de verdade, de algo que ele achava anômalo.”

A declaração, que parece querer reforçar a autenticidade da intenção, apenas escancara o problema: ao dar palco a um conteúdo não verificado, Elizondo, mais uma vez, cria ruído no debate. E ruído, em se tratando de Ufologia — um campo já contaminado por desinformação, teorias da conspiração e fraudes — é sempre um desserviço.

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Essa não é a primeira vez que Elizondo protagoniza episódios ambíguos. Em outubro de 2024, ele divulgou outra imagem, igualmente controversa, alegando tratar-se de uma possível “nave-mãe” próxima à Terra. A fotografia, de baixa qualidade, foi posteriormente ridicularizada nas redes sociais por se parecer mais com uma falha de lente ou artefato digital do que com qualquer objeto de origem exótica. A reportagem publicada no Portal Vigília à época já alertava para os riscos de Elizondo estar se tornando, voluntária ou involuntariamente, um agente de ruído no debate — justamente o oposto do que prometeu ser ao vir a público.

Se somarmos a isso o conteúdo de seu livro Imminent, lançado recentemente e recheado de alegações explosivas e exageradas — como a de que teria havido um acordo de cooperação militar com o Brasil em função da Operação Prato, baseado numa conversa durante um almoço —, a figura de Elizondo vai se tornando cada vez mais difícil de decifrar. Ele é o estrategista frio de uma operação cuidadosamente orquestrada? Um denunciante idealista, mas mal assessorado? Um agente a serviço de interesses que não podemos enxergar?

Mais do que nunca, a pergunta que precisa ser feita é: qual a verdadeira agenda de Luis Elizondo?

A hipótese de que ele esteja operando como peça de manobra — consciente ou não — dentro de uma engrenagem maior, não pode ser descartada. O histórico dele como ex-oficial de contrainteligência do Exército dos EUA, com atuação direta em temas sensíveis e sigilosos, deveria ser suficiente para ao menos levantar essa dúvida. Ao mesmo tempo, sua trajetória pós-AATIP demonstra uma impressionante capacidade de se manter no centro do palco: abandonou a To The Stars Academy (TTSA) quando ela passou a ter mais ambições artísticas do que investigativas, lançou-se em aparições públicas estratégicas, estabeleceu conexões com senadores, militares, jornalistas, produtores de TV e até mesmo com ex-membros do próprio Departamento de Defesa.

Nada disso acontece por acaso.

O problema — e ele é central para a comunidade ufológica séria — é que a maneira como Elizondo tem conduzido sua exposição pública nos últimos meses parece cada vez mais errática, confusa e, em certos momentos, até oportunista. É como se, ao tentar ser um mensageiro da verdade, ele tivesse se tornado parte do próprio problema. Quando diz que está sendo atacado injustamente por “membros da comunidade UFO” que “perderam todo o sentido da foto”, parece esquecer que foi essa mesma comunidade que lhe deu ouvidos, credibilidade e espaço.

E quando essa comunidade cobra responsabilidade, não é por mesquinharia ou ceticismo gratuito. É porque ela sabe o tamanho da batalha que está sendo travada para transformar o fenômeno UAP em um tema respeitável, passível de investigação científica e política séria.

Luis Elizondo foi, sem dúvida, uma das figuras centrais dessa virada. Mas, se continuar agindo como um influenciador mal orientado, que aparece com fotos não verificadas e discursos inflamados, pode terminar sua jornada como aquilo que mais combateu: um propagador de ruído.

A Ufologia não precisa de novos mitos. Precisa de clareza. E talvez esteja na hora de Elizondo decidir, de uma vez por todas, de que lado da história ele quer ficar.

Jeferson Martinho

Jornalista, o autor é empresário de comunicação, dono de agência de marketing digital e assessoria de imprensa, publisher de um portal de notícias regionais na Grande São Paulo, fundador e editor do Portal Vigília.

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