AARO apresenta relatório de 2024 e admite casos anômalos de UAP

Espremido entre duas audiências que seguramente vão reverberar amplas discussões sobre UAP nos Estados Unidos — uma já realizada, no dia 13 de novembro, na Câmara dos Representantes, e a próxima, no dia 19 de novembro, no Senado Federal — o Escritório de Resolução de Anomalias em Todos os Domínios (AARO) do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (DoD) publicou seu Relatório Consolidado Anual para o ano fiscal de 2024 (link para download), detalhando o que considerou avanços e identificando desafios na análise de Fenômenos Anômalos Não Identificados (UAP, na sigla em inglês).
O relatório foi divulgado após um briefing com jornalistas no dia 14 de novembro de 2024 e abrange 757 novos relatos registrados entre maio de 2023 e junho de 2024, elevando o total para mais de 1600 casos desde o início das investigações.
Jon Kosloski, diretor do AARO desde agosto, afirmou que a prioridade do escritório é “ampliar a transparência, reforçar parcerias e aumentar a capacidade de coleta e análise de dados”. Kosloski, com mais de duas décadas de experiência na Agência de Segurança Nacional, onde conduziu pesquisas avançadas em óptica, computação e cripto-matemática, assumiu o cargo impulsionado pelo desafio científico que a investigação de UAPs representa.
A comunidade ufológica engajada na pressão política pela transparência UAP no Departamento de Defesa dos EUA faz apostas bem maiores da atuação de Kosloski em comparação ao seu polêmico antecessor, Dr. Sean Kirkpatrick, alvo constante de críticas e acusações de manipulação de informações e inépcia na defesa da integridade dos chamados denunciantes UAP, que têm prestado informações ao Congresso.
Casos resolvidos envolvem aviões, pássaros, drones, balões e satélites
O relatório do AARO aponta que, dos 757 novos relatos, 169 casos foram esclarecidos. A maioria dos casos resolvidos envolveu objetos prosaicos, como balões, drones, pássaros, satélites e aeronaves. Alguns exemplos ilustram as análises para conclusão desses casos.
Um deles é um episódio descrito como “Caso das Luzes Piscantes”. Um piloto comercial reportou luzes brancas piscando no céu noturno. Sem informações sobre altitude ou velocidade, e sem imagens do evento, o caso inicialmente gerou dúvidas. No entanto, a investigação do AARO revelou que o evento coincidia com o lançamento de satélites Starlink, da SpaceX, em Cabo Canaveral, Flórida. A análise da trajetória orbital dos satélites confirmou que as luzes eram, na verdade, reflexos dos Starlink, desvendando o mistério.
Também foram identificadas ocorrências de pássaros e drones resultando em “blobs amorfos”: em diversos casos, a identificação errônea de pássaros como UAPs ocorreu devido a artefatos de sensores. A compressão e pixelização de imagens, comuns em vídeos e fotos, podem distorcer a forma real de um objeto, criando um “blob” amorfo ou uma forma esférica. O brilho de sensores eletro-ópticos/infravermelhos também contribui para essa distorção. Através da análise detalhada de vídeos, o AARO garante que conseguiu identificar o padrão de “oscilação” característico de asas de pássaros em voo, confirmando a natureza prosaica desses casos.

Nada de detalhes para os casos sem explicação
Apesar dos avanços na resolução de casos, o relatório do AARO reconhece que pelo menos 444 casos permanecem sem dados suficientes para uma análise aprofundada. Além disso, outros 21 casos, por outro lado, demonstram características anômalas significativas e seguem sob investigação.
Durante o briefing com jornalistas, Kosloski mencionou a existência de “avistamentos interessantes” ocorridos repetidamente nos últimos 18 meses. A localização e detalhes específicos desses avistamentos não foram revelados, a fim de preservar a integridade da investigação. Kosloski, contudo, afirmou que, mesmo com sua experiência científica, não consegue explicar a natureza de alguns desses eventos, que continuam a desafiar a compreensão do AARO.
“Há casos interessantes que eu — com minha formação em física e engenharia e tempo na [comunidade de inteligência] — não entendo e não conheço mais ninguém que entenda”, disse Kosloski aos repórteres.
Sua equipe agora está reunindo informações de testemunhas oculares, filmagens e outras fontes de dados para dar sentido aos incidentes, que ele sugeriu terem ocorrido recentemente e repetidamente no último ano e meio.
“Até que tenhamos as informações aprovadas para divulgação, prefiro não dizer onde esses avistamentos ocorreram, mas [eles] são definitivamente avistamentos interessantes”, disse Kosloski.
O relatório do AARO destaca que esses 21 casos apresentam características e comportamentos anômalos que impedem a atribuição a objetos conhecidos ou a fenômenos naturais. A investigação, conduzida em colaboração com parceiros de inteligência e tecnologia, busca determinar a origem e natureza dessas anomalias.
Apesar disso, o chefe do AARO voltou a usar a expressão afirmação já bastante usual de que “até o momento, não há evidências de envolvimento extraterrestres ou de adversários estrangeiros nesses casos”.

Interesse em instalações militares
Dessa vez o relatório do AARO dedicou uma seção específica à observação de UAS (Sistemas Aéreos Não Tripulados), popularmente conhecidos como drones, próximos a infraestruturas nucleares, armas e locais de lançamento nos Estados Unidos. É importante ressaltar que o relatório não faz menção a UAPs (Fenómenos Anômalos Não Identificados) relacionados a instalações nucleares, focando apenas em incidentes envolvendo drones.
As informações sobre esses incidentes foram fornecidas ao escritório pela Administração de Segurança Nuclear e pelo Presidente da Comissão Reguladora Nuclear. No total, foram reportados 18 incidentes nesse contexto.
Detalhes dos Incidentes:
● 10 drones sobrevoaram áreas protegidas por menos de cinco minutos.
● 2 drones apresentaram tempos de voo mais longos, de 53 minutos e 1 hora e 57 minutos, respectivamente.
● A duração do voo é desconhecida nos 6 casos restantes.
● 16 casos envolveram apenas 1 drone, enquanto os 2 casos restantes reportaram 2 drones cada.
● Em pelo menos metade dos casos, a segurança local observou os drones.
Casos Notáveis:
● Em 3 de agosto de 2023, a segurança da Usina Nuclear D.C. Cook recuperou um drone que caiu e o entregou às autoridades locais do Condado de Berrien, Michigan. O relatório não fornece informações adicionais sobre esse drone.
● Entre 10 e 15 de outubro de 2023, a instalação USPER BWXT (antiga USPER Babcock and Wilson Nuclear Energy), em Lynchburg, Virginia, observou sobrevoos de drones por seis noites consecutivas. Em cada ocorrência, apenas um drone foi avistado.
O relatório enfatiza que a presença de UAS nesses incidentes não representa, até o momento, evidências de UAPs nem de ameaças específicas a instalações nucleares.
Aprimorando tecnologias de detecção e monitoramento de UAPs
Para aprimorar a investigação de UAPs, o AARO relata que tem investido em novas tecnologias e na ampliação de parcerias. O sistema protótipo de sensores Gremlin, desenvolvido pelo Georgia Tech Research Institute, será implantado em um local de segurança nacional no primeiro trimestre do ano fiscal de 2025. O Gremlin, que passou por testes em março de 2024, visa coletar dados e estabelecer um padrão de comportamento anômalo para futuras investigações.
Além disso, com o objetivo de ampliar a transparência e o acesso à informação, o AARO lançou o site www.aaro.mil, onde disponibiliza dados desclassificados, vídeos, resoluções de casos, tendências analíticas e informações sobre a missão do escritório. O site também oferece um mecanismo de denúncia seguro para que ex-funcionários e militares possam reportar informações sensíveis sobre programas ou atividades relacionadas a UAPs. Entre os ufólogos e os próprios denunciantes de informações UAP, ainda há dúvidas de que esse seja um canal realmente seguro.
O futuro das investigações do AARO
Apesar dos avanços, o AARO enfrenta desafios significativos. Sem um engajamento adequado e transparente das famosas “agências de três letras”, sempre vão pairar dúvidas sobre a efetividade de seus esforços. A falta de dados precisos somada à limitação de sensores adequados também são obstáculos a serem superados.
Durante o encontro com os jornalistas, Kosloski apresentou vários objetivos ousados, como a “expansão de parcerias internacionais”, “desenvolvimento de tecnologias mais avançadas” e a busca por uma maior compreensão científica dos fenômenos anômalos, mas é uma incógnita a real capacidade (e liberdade) de atuação do escritório para atingir essas metas. Entretanto, no cenário de pressão política crescente, próximo ano promete trazer novas respostas, com a publicação de mais relatórios históricos e a expansão das investigações para além dos atuais hotspots próximos a bases militares.
Com informações de DefenseScoop e AARO.mil