Viral do “orbe” de Manchester: teatro contra crise diplomática dos drones?

Conforme se tornou viral nas redes sociais, a imagem do suposto orbe-UAP (sigla em inglês para Fenômeno Aéreo Não Identificado) no Aeroporto de Manchester passou a dividir a atenção do público com os recorrentes registros de “drones misteriosos” sobre bases militares. As especulações se multiplicam, mas enquanto no caso dos drones a preocupação com segurança se intensifica, no caso de Manchester, a hipótese mais provável aponta para algo bem mais trivial: um balão.

Diversos indícios apontam para essa direção, mesmo que o vídeo, a foto ou ambos sejam autênticos. Incrivelmente, investigadores online, debruçados sobre o material divulgado no Reddit pelo perfil já apagado “CaptainBiggalow”, conseguiram delimitar a data e hora do evento.
“Eu encontrei a data e a hora. 9 de junho – 19h08 UTC todos os aviões estão alinhados exatamente como estão no vídeo”, afirmou o usuário “psytechnic”, que utilizou o posicionamento das aeronaves na pista e dados meteorológicos para chegar à data.
Coincidentemente, no dia 9 de junho, um evento que se assemelhava a um festival estava acontecendo próximo ao aeroporto, como pode ser visto em um vídeo postado no YouTube. A proximidade do festival com o aeroporto, somada à data e hora do avistamento, levanta a possibilidade de que o “orbe” seja, na verdade, um balão proveniente do evento.
A presença de balões no Aeroporto de Manchester não é novidade, como demonstra uma matéria publicada pelo Daily Mail em 23 de junho de 2022. O artigo relata um incidente em que um balão da personagem infantil Peppa Pig de quase um metro de altura foi avistado flutuando sobre a pista, levando a uma mobilização de equipes de emergência.
“Você não poderia inventar isso. O balão flutuou pelas duas pistas. No começo foi engraçado, mas depois, quando o avião apareceu, comecei a me perguntar se deveria ligar para a polícia”, disse Glen Ramsey, que presenciou o incidente.
A combinação desses fatores — data, hora, festival, histórico de balões no aeroporto — enfraquece a tese de que um objeto voador não identificado pairou sobre Manchester. A ausência de outras testemunhas e a falta de cobertura da imprensa local, que tem dado destaque ao caso dos “drones misteriosos“, também contribuem para o ceticismo.

Embora as imagens do “orbe” tenham viralizado e capturado a imaginação do público conectado, a análise crítica dos dados sugere que a explicação mais plausível para o evento seja muito mais terrena do que extraterrestre. A atenção despertada pelo caso, no entanto, demonstra o fascínio e a apreensão dos entusiastas em relação a objetos voadores não identificados, num momento em que os “drones misteriosos” representam uma ameaça real e crescente à segurança internacional.
Na rede, Manchester quase ofuscou drones misteriosos
Enquanto o caso de Manchester caminha para uma explicação plausível, a rapidez com que se tornou um viral, no momento em que as tensões com o aparecimento de drones misteriosos em bases militares estão em alta, é notável. A associação entre os temas foi imediata, com muitos especulando se o “orbe” de Manchester não seria mais um exemplo da mesma ameaça que ronda as instalações militares.
E essa ameaça, ao que tudo indica, segue presente. As aparições de drones não identificados continuam a ocorrer, alimentando a apreensão e a curiosidade do público. Diversos usuários de redes sociais como X.com e Reddit relatam intensa atividade aérea, com caças F-15 voando sem luzes, aviões de transporte C-17 Globemaster III circulando em altitudes elevadas e aeronaves de reconhecimento Boeing Poseidon MRA1 executando manobras incomuns, além da presença de helicópteros Apache. A mobilização de recursos aéreos sugere que as autoridades levam a situação a sério, mas a falta de informações concretas sobre a origem e os objetivos dos drones só faz aumentar as especulações.
No fim da tarde desta sexta-feira, 29 de novembro, o canal “Biggsy”, no Youtube fez uma transmissão ao vivo com imagens que mostram o deslocamento de uma formação triangular muito precisa, ou talvez uma aeronave única com esse formato, sobrevoando a região das bases afetadas. O vídeo, que ainda não foi verificado, se soma a uma série de outros registros de objetos voadores não identificados na área, intensificando o clima de mistério.

Vale lembrar que, como relatado pelo Portal Vigília em matéria publicada em 27 de novembro, o Pentágono convocou uma coletiva de imprensa para se pronunciar sobre o caso, mas as declarações do General de Brigada Patrick Ryder, porta-voz do Departamento de Defesa dos EUA, foram vagas e evasivas.
“O que eu diria (…) é que [os drones] estão sendo monitorados ativamente”, afirmou Ryder, sem confirmar a origem dos objetos ou detalhar as medidas de combate.
A falta de transparência do Pentágono e a mobilização de 60 soldados britânicos para auxiliar nas investigações, como revelado pela jornalista Larissa Brown do The Sunday Times, só contribuem para aumentar a sensação de que algo sério está acontecendo.

Enquanto isso, na internet, diversos usuários se mobilizam para registrar ou transmitir ao vivo imagens dos céus próximos às bases na Inglaterra, numa tentativa de documentar a atividade dos “drones misteriosos”. Essa mobilização, impulsionada pela desconfiança em relação às autoridades e pela ânsia por respostas, demonstra como o caso dos drones se tornou um fenômeno social, capturando a imaginação e a preocupação do público.
Cortina de fumaça para a origem dos “drones”?
No caso de Manchester, a preocupação com a construção da narrativa viral, com a inclusão da foto do objeto no solo, merece atenção. A sequência de eventos descrita pelo suposto piloto “CaptainBiggalow” apresenta uma contradição: a foto do “orbe” em solo deveria ter sido tirada depois do vídeo que o mostra no ar, dado o movimento do avião na pista. Mas fica claro que a narrativa invertida, com a foto antecedendo o vídeo, confere maior curiosidade à história, plantando a ideia de que o objeto realmente estava em solo antes de “disparar” para o céu. Essa montagem cuidadosa da narrativa, explorando a disposição do público a acreditar em eventos extraordinários, desviou, em parte, a atenção da questão mais urgente dos drones misteriosos.

É importante ressaltar que os relatos de drones não identificados sobrevoando bases militares não são recentes. Em janeiro de 2022, a Suécia enfrentou uma série de incidentes semelhantes, com drones de grande porte e asa fixa sendo avistados sobre instalações sensíveis, incluindo usinas nucleares. Na época, o governo sueco admitiu a possibilidade de que as incursões fossem obra de um governo estrangeiro, e as suspeitas recaíram sobre a Rússia.
Uma matéria do The Debrief de 29 de novembro de 2024, sobre os incidentes em bases americanas no Reino Unido, reforça a tese de que a Rússia pode estar por trás dos drones. O texto cita a hipótese de que os drones sejam, na verdade, parte de uma operação de inteligência russa, visando coletar informações sobre as capacidades militares ocidentais. Essa possibilidade, embora não confirmada oficialmente, ganha força no contexto da crescente tensão geopolítica entre a Rússia e o Ocidente, intensificada pela guerra na Ucrânia.
O uso recente de mísseis de longo alcance na Ucrânia colocou o mundo em alerta, elevando o risco de uma escalada do conflito para um cenário global. Nesse contexto, a admissão por parte dos governos ocidentais de que drones russos estariam espionando suas bases militares criaria um dilema diplomático de enorme magnitude. Por um lado, a revelação pública da espionagem poderia ser interpretada como um ato de agressão, evocando a necessidade de imediata resposta militar. Por outro, a omissão e a inércia diante da espionagem comprometeriam a credibilidade dos governos ocidentais, e potencialmente até encorajariam a Rússia e outros adversários a intensificarem suas atividades.

Não seria coincidência — nem incomum, no cenário da contra-inteligência — que uma narrativa do como a do “orbe” de Manchester e sua viralização cuidadosamente calculada, tenha servido como uma distração oportuna, desviando o foco do público da questão mais urgente e perigosa que seriam drones estrangeiros. Também não seria a primeira vez que a Ufologia é usada como cortina de fumaça.
De toda forma, é realmente pouco provável que tais objetos não tenham sido desativados ou abatidos por armamentos convencionais, embora o Pentágono não admita. E se forem mesmo UAPs (ou OVNIs) de origem desconhecida, tanto pior.
Dessa vez, no entanto, parte do plano parece (ainda) não ter dado muito certo, já que o episódio de Manchester não caiu nas graças da mídia mainstream. Mas essa história ainda está se desenrolando e enquanto a comunidade online se distrai com um possível balão, uma ameaça real e concreta se aproxima, lançando uma perigosa sombra sobre a fragilidade da paz mundial.