Cometas: outubro de 2024 deve contar com dois viajantes celestes

O cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan-ATLAS), descoberto no início de 2023, é um dos eventos astronômicos mais aguardados desse ano. Sua passagem tem sido um espetáculo celeste digno de atenção. O tempo chuvoso em algumas regiões e a fumaça que se espalhou pelo país provavelmente atrapalharam sua visibilidade no Brasil a partir do finalzinho de setembro e início de outubro de 2024.
Quem perdeu a chance de observar na primeira janela de visibilidade, quando o C/2023 A3 podia ser visto a Leste, pouco antes do nascer do Sol, terá uma segunda chance a partir dessa semana. Agora, no entanto, o astro será visível no Oeste, durante e pouco depois do por do Sol. No Brasil, as melhores chances de observar a olho nu devem acontecer entre 10 e 15 de outubro, entre 17h30 e 18h45, tanto mais tarde quanto mais avança o mês. Mas cuidado ao tentar observar nos momento quando o Sol ainda estiver visível: ver o astro rei de binóculos, mesmo perto do por do sol, pode causar cegueira definitiva. Então, use um filtro apropriado.

Durante a primeira janela de observação, em 30 de setembro de 2024, o astrofotógrafo brasileiro Gabriel Zaparolli, fez fotos sensacionais a partir do topo do morro dos Cabritos, em Praia Grande, Santa Catarina. As imagens ficaram tão espetaculares que uma delas foi escolhida como destaque do dia no “Astronomy Picture of the Day” da NASA, o APOD, no dia 4 de outubro de 2024.
O cometa que seguia em direção ao Sol surpreendeu ao passar pelo astro e não se desintegrar, e sua maior aproximação da Terra ocorrerá agora em outubro de 2024. Durante esse período, ele deverá atravessar o céu, movendo-se lentamente com uma cauda que se estende por vários graus no firmamento. Com um núcleo de gelo e poeira, C/2023 A3 nos lembra os “viajantes gelados” que trazem consigo materiais das profundezas do Sistema Solar, ajudando a astrônomos a entender mais sobre as origens do nosso próprio sistema planetário.
Oportunidade dupla: vem aí o cometa C/2024 S1
E se a notícia da passagem do C/2023 A3 por si só já não fosse espetacular, recentemente foi descoberta uma nova e emocionante oportunidade para os observadores do céu: o cometa C/2024 S1 (ATLAS), identificado em setembro de 2024. Este cometa é parte da família Kreutz de “sungrazers”, ou seja, cometas que passam perigosamente perto do Sol. Prevê-se que ele atinja seu ponto mais próximo do Sol, o periélio, em 28 de outubro de 2024. Se sobreviver à intensa proximidade com o Sol, o cometa pode alcançar um brilho de magnitude entre -5 e -7, possivelmente até sendo visível durante o dia.
Os melhores momentos de observação para o hemisfério sul ocorrerão antes do periélio, no final de outubro, quando o cometa deve aparecer no céu noturno. No hemisfério norte, se o C/2024 S1 sobreviver à sua passagem pelo Sol, será visível no céu da manhã no início de novembro. Há uma expectativa de que ele possa competir em brilho com Vênus, o que criaria um espetáculo fascinante no céu.
A observação de cometas sungrazers é sempre incerta, pois eles podem se desintegrar ao se aproximar do Sol, mas a comunidade astronômica está otimista de que este pode se tornar um dos mais brilhantes dos últimos anos, comparável ao famoso cometa Ikeya-Seki, de 1965.

Agora que estamos cientes da passagem desse corpo celeste específico, é interessante comparar o cometa com outros fenômenos noturnos. Muitas vezes, os observadores podem confundir diversos eventos no céu com OVNIs ou UAPs. Vamos explorar essas ocorrências.
1. Meteoros e chuvas de meteoros
Meteoros, frequentemente chamados de “estrelas cadentes”, são pequenos(às vezes nem tão pequenos assim) fragmentos de rocha ou poeira que entram na atmosfera terrestre a alta velocidade, incinerando-se devido ao atrito. Quando essa entrada acontece de maneira constante e em grupos, temos o que é conhecido como chuva de meteoros.
Uma curiosidade: dependendo do tamanho, sua massa e composição, alguns meteoros (ou uma parte do que restou na queima na atmosfera) sobrevive ao atrito com o ar e acaba caindo no solo ou no mar. Nestes casos passam a ser chamados de meteoritos.
Características:
- Horário de observação: Embora meteoros isolados possam ser vistos a qualquer momento da noite, chuvas de meteoros têm picos específicos de atividade, geralmente no início da madrugada, quando a Terra atravessa os rastros de detritos deixados por cometas.
- Características físicas: Fragmentos de poeira e rochas, de poucos gramas a algumas toneladas.
- Trajetória: Geralmente linear, com um rápido movimento pelo céu, durando de poucos segundos até alguns minutos no caso de objetos maiores ou das chuvas intensas.
Algumas das chuvas de meteoros mais conhecidas incluem as Perseidas, visíveis em agosto, e as Geminidas, em dezembro.
2. Satélites artificiais
Diferente do que chamamos de “satélite natural”, que é o caso da Lua e eventualmente alguns meteoritos que acabam orbitando a Terra, nos últimos anos, o número de satélites artificiais — ou seja, fabricados pelo homem —orbitando nosso planeta cresceu exponencialmente.
Isso se deve, em grande parte, a constelações como a Starlink, da SpaceX, que lançou centenas de satélites para prover internet global. Esses objetos artificiais frequentemente são visíveis no céu, principalmente logo após o pôr-do-sol ou antes do nascer do Sol, quando ainda estão iluminados pela luz solar.
Características:
- Horário de observação: Primeiras horas da noite ou nas últimas antes do amanhecer.
- Características físicas: Pequenos pontos de luz que se movem em trajetórias uniformes e constantes, sem piscar.
- Trajetória: Movem-se em uma linha reta, geralmente de oeste para leste, a uma velocidade constante e não mudam de direção.
Os satélites da Starlink, quando vistos em grupo, formam o que é conhecido como “trem de satélites”, sendo confundidos por muitos com objetos voadores não identificados.
3. Estágios de foguetes e reentradas atmosféricas
Quando foguetes lançam satélites ou missões espaciais, os estágios superiores muitas vezes ficam em órbita temporária antes de cair de volta na atmosfera. Quando isso acontece, esses estágios podem ser vistos queimando na reentrada, em um fenômeno que lembra uma bola de fogo cruzando o céu.
Em algumas regiões próximas dos locais de lançamento, é possível inclusive ver o o rastro do próprio foguete em si, cuja característica mais marcante é uma cauda que às vezes adquire uma forma de “gota invertida”. Em raros casos de problemas com os estágios iniciais, em que o foguete (ou às vezes um míssil) perde o controle, essa forma causada pelos gases da combustão pode se transformar numa curiosa espiral ou formatos ainda mais estranhos.
Características:
- Horário de observação: Ocasional e não previsível com exatidão para a maioria dos observadores, mas geralmente ocorre horas ou dias após o lançamento.
- Características físicas: Brilho intenso, muitas vezes com uma trilha de fumaça ou fragmentos visíveis.
- Trajetória: Movimento linear, mais lento do que os meteoros, com uma curva que acompanha a reentrada.
Reentradas de satélites desativados ou estágios de foguetes são um espetáculo impressionante, podendo ser facilmente confundidos com avistamentos de UAPs devido ao seu brilho intenso e comportamento imprevisível.
4. ISS – Estação Espacial Internacional
As estações espaciais — sim, agora temos a Estação Espacial Chinesa, Tiangong, além da Estação Espacial Internacional (ISS) são objetos artificiais fantásticos criados pelo homem. A ISS, em especial, pelo seu tamanho, é um dos objetos mais brilhantes no céu noturno.
Devido ao seu tamanho e proximidade da Terra, a ISS pode ser vista a olho nu como um ponto de luz intenso que cruza o céu em alta velocidade.
Características:
- Horário de observação: Geralmente no início da noite ou madrugada, quando ainda é iluminada pelo Sol.
- Características físicas: Brilho intenso e constante, sem piscar.
- Trajetória: A ISS move-se em linha reta, e sua passagem dura cerca de 5 minutos em média, dependendo de sua altura orbital no momento da observação.
A regularidade de suas passagens, que podem ser previstas com alta precisão, facilita sua identificação, diferenciando-a de fenômenos anômalos.
Ver essa foto no Instagram
5. Planetas visíveis a olho nu
Alguns dos planetas do Sistema Solar, como Vênus, Marte, Júpiter e Saturno, são facilmente visíveis no céu a olho nu, especialmente em períodos de oposição, quando estão mais próximos da Terra. Vênus, em particular, é conhecido como a “Estrela D’Alva” por ser extremamente brilhante, sendo visível logo após o pôr-do-sol ou antes do amanhecer.
Características:
- Horário de observação: Dependendo do planeta, podem ser observados no início da noite, madrugada ou ao amanhecer.
- Características físicas: Aparecem como pontos brilhantes, com brilho constante, mas sem cintilação (ao contrário das estrelas).
- Trajetória: Movem-se muito lentamente ao longo das semanas em relação às estrelas, tornando sua observação interessante ao longo de vários dias.
Potencializados por filmagens em zoom no celular, com distorção de cores, muitos relatos de avistamentos de “luzes estranhas” no céu são, na verdade, planetas como Vênus, que, devido ao seu brilho, é frequentemente confundido com algo não identificado.
6. Nuvens Estratosféricas e Outras Formações Atmosféricas
Fenômenos atmosféricos, como nuvens estratosféricas e nacaradas, são formações raras que podem surgir em altitudes elevadas, refletindo a luz solar mesmo após o pôr-do-sol. Essas formações são extremamente incomuns e ocorrem principalmente em regiões de alta latitude, mas podem, em alguns casos, serem vistas em latitudes mais baixas.
Características:
- Horário de observação: Logo após o pôr-do-sol ou antes do amanhecer.
- Características físicas: Nuvens coloridas e iridescentes, brilhando em tons de rosa, verde e azul.
- Trajetória: Permanecem estacionárias ou se movem lentamente, como as nuvens comuns.
Essas nuvens podem ser confundidas com objetos luminosos ou de origem artificial devido à sua aparência incomum.
7. O Valor de Diferenciar Fenômenos Astronômicos de UAPs
Com a crescente visibilidade de fenômenos celestes e a proliferação de satélites e lixo espacial, a identificação correta de objetos no céu é mais importante do que nunca. Relatos de OVNIs ou UAPs (Fenômenos Aéreos Não Identificados) muitas vezes são resultado de mal-entendidos sobre esses eventos naturais e artificiais. Conhecer as características de cada um desses fenômenos pode evitar confusões e aumentar a compreensão pública sobre o que realmente estamos vendo no céu.
Esse conhecimento não só enriquece a experiência de observação do céu, mas também ajuda a separar o que é explicável do que realmente merece investigação mais aprofundada, no contexto da busca por evidências de vida extraterrestre ou tecnologias avançadas.